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Insuficiência Cardíaca: um chamado urgente à ação para salvar vidas
Conscientização, diagnóstico precoce e tratamento eficaz são essenciais
A insuficiência cardíaca (IC) é uma condição grave, muitas vezes silenciosa e perigosamente subestimada, tanto por pacientes quanto por profissionais de saúde. Contrariando a percepção geral, seu prognóstico pode ser mais sombrio que o de muitos tipos de câncer. A urgência em reconhecer seus sinais e iniciar o tratamento adequado é real, pois as terapias disponíveis hoje podem reduzir drasticamente o risco de hospitalizações e mortes, mudando o curso dessa história para milhões de pessoas.
Os números são alarmantes e revelam a dimensão do problema. No Brasil, entre 2019 e 2023, foram registradas mais de 941 mil internações por IC. Globalmente, a doença afeta mais de 64 milhões de indivíduos. A taxa de mortalidade anual para pacientes com IC pode chegar a 15%, e quase metade dos sobreviventes enfrenta novas hospitalizações em apenas um ano — um cenário mais grave do que o de diversos cânceres.
Essa condição representa uma das principais causas de internação hospitalar, especialmente entre adultos acima de 65 anos, onde responde por até 1 em cada 5 hospitalizações. No Brasil, estima-se que 2,5 milhões de pessoas convivam com a IC, gerando um custo anual superior a R$ 1 bilhão para o sistema de saúde. Este fardo tende a crescer, impulsionado pelo envelhecimento da população — projeta-se que em 2050, quase 30% dos brasileiros terão 60 anos ou mais — e pela baixa adesão ao tratamento, muitas vezes ligada à falta de compreensão sobre a doença.
A desigualdade no cuidado e a complexidade da IC
A realidade brasileira expõe uma preocupante desigualdade: pacientes com maior escolaridade e renda tendem a apresentar menor mortalidade e melhores resultados. Em contrapartida, os mais vulneráveis social e economicamente têm menos acesso a tratamentos modernos, morrendo até três vezes mais cedo e sendo hospitalizados com frequência até cinco vezes maior.
Além disso, a IC é mais complexa do que se imagina. Um estudo no Distrito Federal (Estudo CaRe Brasília – CaRe:QCO-HF) mostrou que 64% dos casos em mais de mil pacientes tinham origem não isquêmica, sendo causados por hipertensão ou diabetes não controlados, doenças valvares, doença de Chagas e outras miocardiopatias. Isso demonstra que a IC vai muito além da cardiopatia isquêmica tradicionalmente associada, exigindo um olhar atento aos diversos sinais e manifestações em cada paciente.
A chave está na conscientização e na atuação médica
A transformação desse cenário começa no consultório. O médico desempenha um papel fundamental não apenas na prescrição, mas na educação e engajamento do paciente. É crucial abandonar jargões como “coração fraco” ou “falta de bomba” sem uma explicação clara. Precisamos construir, junto ao paciente, uma narrativa compreensível sobre o que é a IC: uma doença crônica, progressiva e com risco de vida, mas controlável com tratamento eficaz e acompanhamento adequado.
Utilizar uma linguagem empática, comparações diretas e dados reais sobre os benefícios comprovados do tratamento (redução de hospitalizações, melhora na qualidade de vida, aumento da sobrevida) é decisivo para melhorar a adesão. Envolver a família e a rede de apoio do paciente também fortalece o compromisso com o tratamento, mostrando que é possível viver bem por muitos anos.
Pacientes também precisam ser agentes ativos em sua saúde. Reconhecer sintomas como falta de ar, inchaço nas pernas, cansaço excessivo e tosse persistente é o primeiro passo. Ao notar esses sinais, buscar avaliação médica rapidamente é essencial. Uma vez diagnosticado, compreender a importância do tratamento e aderir a ele rigorosamente faz toda a diferença.
Uma responsabilidade de todos
Paralelamente, é necessário um compromisso sistêmico. Precisamos ampliar programas de educação em saúde, especialmente na atenção primária, capacitando equipes para identificar e manejar a IC precocemente. Incentivar a formação médica continuada com foco em comunicação empática e educação terapêutica é vital. Políticas públicas específicas, incluindo campanhas de conscientização para o público leigo e para a classe médica, podem mudar o panorama atual.
A insuficiência cardíaca não pode mais ser uma coadjuvante nos cuidados de saúde. Ela exige protagonismo clínico e atenção redobrada. Médicos, como principais agentes de mudança, e pacientes, como parceiros ativos no cuidado, têm o poder de transformar essa realidade. Ao abordar a IC com a seriedade, a empatia e a informação necessárias, destacando que o diagnóstico precoce e a adesão ao tratamento salvam vidas e reduzem hospitalizações, podemos diminuir mortes evitáveis e melhorar significativamente a qualidade de vida de milhões de brasileiros. A hora de agir é agora.
Dr. Luiz Sérgio Carvalho
Médico PhD em Ciências Cardiovasculares, professor e especialista em investigação clínica, saúde e liderança
Por Redação Brazil Health